segunda-feira, 30 de abril de 2012

Vai ter uma festa
que eu vou dançar
até o sapato pedir pra parar.

aí eu paro
tiro o sapato
e danço o resto da vida.

Chacal

Não te aflijas com a pétala que voa:
também é ser, deixar de ser assim.


Rosas verá, só de cinzas franzida,
mortas, intactas pelo teu jardim.


Eu deixo aroma até nos meus espinhos
ao longe, o vento vai falando de mim.


E por perder-me é que vão me lembrando,
por desfolhar-me é que não tenho fim.

Cecília Meireles 
Às vezes eu penso em afastá-la com um gesto bem rude, para que ela não pense mais em uma possível reaproximação. Eu a amo, mas o meu amor não é um amor saudável, é aquele amor cruel, que machuca tanto a quem tá sendo amado quanto a quem ama. Não sei, de alguma forma, esse fazer-sofrer era necessário, necessário também não sei para que, mas era. Era um daqueles defeitos que não podia ser cortado, como já dizia Clarice, porque senão o edifício inteiro desabava, e o meu edifício era sustentado por aquele defeito, aquele defeito de-afastar-as-pessoas-da-forma-mais-crue
l-possível. E eu a queria perto de mim, sempre; então com uma neurótica individualidade eu iria feri-la, então por ela, por mim, por nós, pelo amor, eu teria que aprender uma forma sutil de afastá-la, porque não estava nos meus planos desabar nenhum edifício.

[desculpa]

 Cecília Helena
'Para perder menos tempo com joguinhos. Para vencer o medo. Para dizer o que tiver que ser dito, mas não em outro idioma. Por favor. Chega de tanto tentar salvar nossa pele. Já sabemos, ela alcançará seu fim. Salvemos nossa alma da ruína, desse excesso de gestos comedidos, do medo, da solidão. Porque fugir é instintivo, e é biologicamente tão mais fácil e provável. Ficar é escolha.Que haja amor e menos covardia nas nossas escolhas... Senhor, escutai as nossas preces. Amém.'


Cecília Braga
Trabalhas sem alegria para um mundo caduco
onde as formas e ações não encerram nenhum exemplo.
Praticas laboriosamente os gestos universais
sentes calor e frio, falta de dinheiro, fome e desejo sexual.

Heróis enchem os parques da cidade em que te arrastas
e preconizam a virtude, a renúncia, o sangue- frio, a concepção.
A noite, se neblina, abrem guarda- chuvas de bronze
ou se recolhem aos volumes de sinistras bibliotecas.

Amas a noite pelo poder de aniquilamento que encerras
e sabes que, dormindo, os problemas te dispensam de morrer.
Mas o terrível despertar prova a existência da Grande Máquina
e te repõe, pequenino, em face de indecifráveis palmeiras.

Caminhas entre os mortos e com eles conversa
sobre coisas do tempo futuro e negócios do espirito.
A literatura estragou suas melhores horas de amor.
Ao telefone perdeste muito, muitíssimo tempo de semear.

Coração orgulhoso, tens pressa de confessar tua derrota
e adiar para outro século a felicidade coletiva.
Aceitas a chuva,a guerra, o desemprego e a injusta distribuição
porque não podes sozinho dinamitar a ilha de Manhattan.


Carlos Drummond de Andrade.


Eu preciso inventar um amor e é com tanta sinceridade que te digo isso meu amigo. Quero um amor inventado. Ou melhor, quero uma paixão inventada. Porque paixões sim me destroem em questão de dias, minutos eu diria. Quero sofrer, chorar, me sentir estraçalhada o dia todo por estar gostando da pessoa errada e no final do dia sorrir –idiotamente sorrir - por gostar tanto de alguém e me sentir inspirada, viva. Quero daquelas paixões que me fazem andar de um lado pra outro da sala pensando em tudo e ao mesmo tempo em nada. Preciso de uma paixão que me faça fumar dezenas de cigarros na intenção de aliviar tensões, que me faça beber uma dúzia de doses de vodca na esperança de esquecer, mesmo que no fundo eu saiba que só vai me fazer lembrar ainda mais. Preciso de tudo que estar apaixonada proporciona. Quero borboletas no estômago, quero o coração batendo forte, quero minhas mãos suadas. Quero todos aqueles pensamentos bobos que somente os apaixonados possuem, pelo simples e significativo fato de estarem apaixonados. Quero uma vida em cores vivas. ’

Camila Aguilera

Amor amor

(Sueli Costa e Cacaso)
quando o mar
quando o mar tem mais segredo
não é quando ele se agita
nem é quando é tempestade
nem é quando é ventania
quando o mar tem mais segredo
é quando é calmaria

quando o amor
quando o amor tem mais perigo
não é quando ele se arrisca
nem é quando ele se ausenta
nem quando eu me desespero
quando o amor tem mais perigo
é quando ele é sincero

sexta-feira, 27 de abril de 2012

É vergonha, pura e feroz, o que me dilacera. Vergonha de ser ser humano. Essa raça podre e egoísta que domina o mundo e da qual eu, talvez devido à pior das piores maldições do Egito, fatalmente pertenço, sendo igualmente desmerecedor de qualquer gesto que faça lembrar um sentimento. Deus não está do nosso lado, a criação outrora realizada já se perdeu nos buracos negros do passado e nós não somos, nem através dos olhos mais cegos, aquilo que uma divindade sonhou. Não pense vós que o que me acomete agora é simplesmente uma furiazinha tola, uma má constatação ou, para os incapazes de ver mais do que um palmo à sua frente, simplesmente falta de amor. Essa onda de certeza que bate vem de uma constatação simples como a de que o céu é azul e as mulheres melhores que os homens. É só olhar para dentro de si e ver o suspiro curto da alma se afogando em tanta lama. Logo a alma, ultimo raio de sol para nós podermos voltar como seres morais e dignos do significado verdadeiro da palavra “pessoa”, morre para que no seu trono sente-se majestoso esse produto criado pela sociedade.
Uma lágrima rola sim, não lamuriando o fato de eu pertencer à humanidade, mas para servir como prova de que minha vergonha vem de cada gota de sangue que um humano fez escorrer em outro, cada humilhação lançada à outra pessoa esta contida nessa lágrima, cada dor e desprezo que nós temos por nós mesmos. É uma lágrima densa, superior à esfera anterior ao Big-Ban, gerador desse mundo gentil, acolhedor da própria peste que o destrói. Hei sozinho indagar sobre qual rumo tomei, que erro cometi para não poder ter nascido planta ou bicho...
Animais não matam uns aos outros para subirem em tronos, árvores nunca se vingam, bactérias não têm ideologias que as fazem pensar superiores, no dever de exterminar o que não lhes é semelhante, não há holocausto em colônias de formigas nem imperialismo entre as cobras mais venenosas. Somos nós a ovelha negra da natureza. Os cegos me ensinaram. Ensinaram que para ver, não basta ter os olhos abertos, mas também a mente.Uma pena de mim que sinto, e de todos os outros que são como eu, pobres coitados nós, nascidos com o duro fardo de sermos gente, coisa fétida e diminuta.Que esperança se há de ter?

Anderson Pereira Santiago

quinta-feira, 26 de abril de 2012

Pode parecer promessa
mas eu sinto que você é a pessoa
mais parecida comigo
que eu conheço
só que do lado do avesso

pode ser que seja engano
bobagem ou ilusão
de ter você na minha
mas acho que com você eu me esqueço
e em seguida eu aconteço

por isso deixo aqui meu endereço
se você me procurar
eu apareço
se você me encontrar
te reconheço.


Alice Ruiz
Bukowski

''Não sinta pena de mim, sou um competente e satisfeito ser humano. Sinta pena de outros que irritados reclamam que constantemente rearranjam suas vidas como fazem com as mobílias. Falseando atitudes e amigos, a confusão deles é constante e ela atingirá todos aqueles que eles encostarem.
Com eles, cuidado: uma de suas palavras favoritas é “amor”.
E cuidado com aqueles que apenas tomam instruções de seu Senhor. Por eles terem falhado completamente em suas próprias vidas."

 

Paulo Leminski .

Meu professor de análise sintática era o tipo do sujeito inexistente.
Um pleonasmo, o principal predicado de sua vida,
regular como um paradigma da 1ª conjunção.
Entre uma oração subordinada e um adjunto adverbial,
ele não tinha dúvidas: sempre achava um jeito
assindético de nos torturar com um aposto.
Casou com uma regência.
Foi infeliz.
Era possessivo como um pronome.
E ela era bitransitiva.
Tentou ir para os EUA.
Não deu.
Acharam um artigo indefinido na sua bagagem.
A interjeição do bigode declinava partículas expletivas,
conectivos e agentes da passiva o tempo todo.
Um dia, matei-o com um objeto direto na cabeça.




Lindas fotos. Vintage. Gosto muito.

sábado, 21 de abril de 2012

The Way You Look Tonight

Rod Stewart



Someday, when I'm awfully low
When the world is cold
I will feel a glow just thinking of you
And the way you look tonight


You're so lovely, with your smile so warm
And your cheeks so soft
There is nothing for me but to love you
And the way you look tonight


With each word your tenderness grows
Tearing my fears apart
And that laugh that wrinkles your nose
Touches my foolish heart


Yes you're lovely, never ever change
Keep that breathless charm
Won't you please arrange it?
'Cause I love you
Just the way you look tonight


With each word your tenderness grows
Tearing my fears apart
And that laugh that wrinkles your nose
Touches my foolish heart


Yes you're lovely, never ever change
Keep that breathless charm
Won't you please arrange it?
'Cause I love you
Just the way you look tonight
Just the way you look tonight
Darling
Just the way you look tonight

 
Como você está essa noite
Algum dia, quando eu estiver terrivelmente chateado
Quando o mundo estiver frio
Eu me sentirei bem só de pensar em você
E como você está essa noite


Você é adorável, com seu sorriso tão aconchegante
E suas bochechas tão macias
Não existe nada para mim além de amar você
E como você está essa noite


A cada palavra, sua ternura cresce
Levando meus medos embora
E aquela risada que enruga seu nariz
Toca meu coração bobo


Sim, você é adorável, nunca, jamais mude
Mantenha esse charme que me tira fôlego
Você não irá, por favor, arranjar isso?
Pois eu te amo
Exatamente como você está essa noite


A cada palavra, a sua ternura cresce
Levando meus medos embora
E aquela risada que enruga seu nariz
Toca meu coração bobo


Sim, você é adorável, nunca, jamais, mude
Mantenha esse charme que me tira o fôlego
Você não irá, por favor, arranjar isso?
Pois eu te amo
Exatamente como você está essa noite
Exatamente como você está essa noite
Querida
Exatamente como você está essa noite



Essa emociona até quem já morreu.  A primeira vez que ouvi essa música foi no filme: O casamento do meu melhor amigo, na voz do ator Dermot Mulroney. Rod Stewart que me desculpe, mas me emocionei muito mais com Dermot cantando pra Julia. Inclusive, é a melhor cena do filme.

Retrato em Branco e Preto

Tom Jobim

Já conheço os passos dessa estrada
Sei que não vai dar em nada
Seus segredos sei de cor
Já conheço as pedras do caminho,
E sei também que ali sozinho,
Eu vou ficar tanto pior
E o que é que eu posso contra o encanto,
Desse amor que eu nego tanto
Evito tanto e que, no entanto,
Volta sempre a enfeitiçar
Com seus mesmos tristes, velhos fatos,
Que num álbum de retratos
Eu teimo em colecionar


Lá vou eu de novo como um tolo,
Procurar o desconsolo,
Que cansei de conhecer
Novos dias tristes, noites claras,
Versos, cartas, minha cara
Ainda volto a lhe escrever
Pra lhe dizer que isso é pecado,
Eu trago o peito tão marcado
De lembranças do passado e você sabe a razão
Vou colecionar mais um soneto,
Outro retrato em branco e preto
A maltratar meu coração

Letra linda, uma simplicidade que encanta. Amei quando li a primeira vez e sempre volto a me encantar quando releio.

quarta-feira, 11 de abril de 2012

FADAS E BRUXAS

Metade de mim é fada,
a outra metade é bruxa.
Uma escreve com sol,
a outra escreve com a lua.
Uma anda pelas ruas
cantarolando baixinho,
a outra caminha de noite
dando de comer à sua sombra.
Uma é séria, a outra sorrí;
uma voa, a outra é pesada.
Uma sonha dormindo,
a outra sonha acordada.
 

               Roseana Murray.

terça-feira, 10 de abril de 2012


Com Leminski foi assim: amor a primeira lida.
Poeta brasileiro, nascido em Curitiba. Escrevia e adorava a poesia Haikai (poema curto de origem japonesa). Morreu em 1989 aos 45 anos.



["amei em cheio
meio amei-o

meio não amei-o"]


["vazio agudo
ando meio
cheio de tudo"]



["isso de querer
ser exatamente aquilo
que a gente é
ainda vai
nos levar além "]



[Bem no fundo]
 no fundo, no fundo,
bem lá no fundo,
a gente gostaria
de ver nosso problemas

resolvidos por decreto

a partir desta data,
aquela mágoa sem remédio
é considerada nula
e sobre ela -- silêncio perpétuo

extinto por lei todo o remorso,
maldito seja quem olhar pra trás,
lá pra trás não há nada,
e nada mais

mas problemas não se resolvem,
problemas têm família grande,

e aos domingos saem todos passear
o problema, sua senhora
e outros pequenos probleminhas




[" Um bom poema leva anos
      um bom poema
leva anos
      cinco jogando bola,
mais cinco estudando sânscrito,
      seis carregando pedra,
nove namorando a vizinha,
      sete levando porrada,
quatro andando sozinho,
      três mudando de cidade,
dez trocando de assunto,
      uma eternidade, eu e você,
caminhando junto"] 
[Merda e ouro]
Merda é veneno.
No entanto, não há nada
que seja mais bonito
que uma bela cagada.
Cagam ricos, cagam padres,
cagam reis e cagam fadas.
Não há merda que se compare
à bosta da pessoa amada.
Paulo Leminski.
" O escritor não escreve com intenções didático-pedagógicas. Ele escreve para produzir prazer. Para fazer amor. Escrever e ler são formas de fazer amor. È por isso que os amores pobres em literatura ou são de vida curta, ou são de vida longa e tediosa."


Rubem Alves.

domingo, 8 de abril de 2012





Estava pensando em quem sou e no que nos faz ser quem somos. Sou um aglomerado de rastros, rastros que foram deixados em mim por pessoas, sabores, cheiros, lugares, conversas, silêncio, leituras, músicas e et cetera. Cada pessoa que conheci deixou um rastro em mim, cada livro que li, músicas que ouvi, conversas que tive, cada momento que fiquei só comigo mesma, cada evento/acontecimento me fez ser quem sou, me fez pensar da forma como penso. Esse pode ser o motivo das pessoas serem tão diferentes, a forma como vivem suas experiências, como reagem a certas situações. Se recebemos o que nos foi dado sem pensar o porquê daquilo, se não temos a capacidade de discernir entre o que devemos aproveitar e o que é lixo, corremos o risco de nos tornarmos pessoas pequenas, esquecendo cada vez mais os seres humanos que deveríamos ser.
Se conheci pessoas limitadas, com essas aprendi que deveria ir além, expandir-me. Se conheci pessoas expansivas, com essas aprendi a recolher-me. As pessoas com alma pura me ensinaram a purificar meu interior, com as pessoas ruins aprendi que ser bom é bem melhor.
Algumas pessoas extraem de você até o que nem você mesmo sabia que possuía: uma força, uma luz, um saber, um olhar e até uma gargalhada que você já havia esquecido.
Sou esse conjunto de rastros e não me contento com a superficialidade das coisas e muito menos das pessoas, quero saber o que tem por dentro. E se há algo por dentro, por que não mostrar? Parece que a vida virou um grande jogo onde quem tem mais pontos é quem consegue esconder melhor quem se é de verdade. Ser você mesmo implica em ser diferente e ser diferente se tornou quase um pecado. Quanto mais igual a todo mundo você for, mais aceito você é. Mesmo cabelo, mesmas roupas, mesmos acessórios, mesmos músculos definidos, mesmo pensamento estreito e por ai vai. Quase sempre as pessoas se perdem nesse mundo de aparências, e o pior é que quase nunca se acham novamente. Não deve haver coisa mais desconcertante do que não poder se achar e lidar com o que tudo isso implica. Ter sua opinião ou optar por não tê-la, usar o que quiser, ir onde tem vontade, saber onde se quer ir e ter a certeza de que nada do que você não quer será feito por você mesmo. O preço a se pagar ao se perder na superficialidade é nunca mais se encontrar com seu eu de verdade e esquecer seus rastros mais profundos.
Que eu nunca me perca.
Enquanto eu souber quem sou vou poder ser eu mesma.

Bruna.
"Eu sempre esperei viver uma história de cinema, ouvir cantadas de filme francês, ganhar salário de estrela, ter amigos de sitcom, corpo de capa de revista e enterro de celebridade. Ai eu lembrei que os filmes de que eu mais gosto são aqueles despretensiosos que contam a história de uma pessoa idiota como eu." 

Tati Bernardi.

terça-feira, 3 de abril de 2012

Woody Allen e seus pensamentos :

"As pessoas boas dormem muito melhor à noite do que as pessoas más. Claro, durante o dia as pessoas más se divertem muito mais"

"O cérebro é o meu segundo órgão favorito"

"Quer fazer Deus rir? Então conte seus planos a Ele..."

"O sexo é o alívio da tensão. O amor é a causa"

" O amor é a resposta, mas enquanto você está esperando, o sexo é capaz de fornecer boas perguntas"

"A realidade é dura, mas ainda é o único lugar onde se pode comer um bom bife"

"Você pode viver até os cem anos se abandonar todas as coisas que fazem com que você queira viver até os cem anos"

"Só há um tipo de amor que dura, o não correspondido"

"Eu não tenho medo de morrer. Só não quero lá estar quando isso acontecer"

"Algumas vezes, um clichê é a melhor forma de se explicar um ponto de vista"

"Interessa-me o futuro porque é o lugar onde vou passar o resto de minha vida"

"Se eu acho que sexo é sacanagem? Só quando é bem feito"

"Faço análise há trinta anos e a única frase inteligente que já ouvi do meu analista é a de que preciso de tratamento"

"...Somente um amor incompleto pode ser romântico..."(Vicky, Cristina Barcelona)

"Que mundo! Poderia ser maravilhoso se não fossem as pessoas"

"Sexo é a coisa mais divertida que eu já fiz sem rir"

"A vantagem de ser inteligente é que podemos fingir que somos imbecis, enquanto o contrário é completamente impossível"
Julgue pela capa

Silhuetas em frente ao oceano, muita bruma e cores em tons pastel:Estes são aqueles filmes para chorar. Amores distantes, escolhas difíceis, laços de família desfeitos e muitas, muitas lágrimas.




Casais de costas um para o outro:Sim, nós vamos começar o filme bem, brigaremos por algum motivo sem sentido, mas no final o amor vencerá. E sim, podem ocorrer piadas pelo meio do caminho.
 

As coisas simples da vida, por exemplo, um banco de praça:Existe coisa mais singela do que se sentar em um banco de praça e observar a vida ao seu redor? Não, não existe e no cinema isso quer dizer filmes com alto teor de lições de vida.
 

Spoilers:O personagem mais interessante do filme é o fundo do pôster e o que interessa saber do filme vem logo encima do seu rosto.



 
Tom Cruise:Para terminar, o mocinho-mór do cinema americano, Tom Cruise e o seu maravilhoso perfil.

Katia Almeida

domingo, 1 de abril de 2012


Anita Malfatti

- O homem de sete cores
Essa tela foi exposta em 1922 na famosa semana de arte moderna e recebeu fortes críticas do escritor Monteiro Lobato. Era um estilo totalmente inovador para a época, posteriormente a artista consagrou-se como uma grande pintora brasileira.
Hora de esquecer

E o que eu desejo para mim e para você é esquecimento...
Coisa estranha de se desejar, parece mais uma maldição – pois quem é tolo de querer perder a memória? Eu mesmo vivo falando sobre a felicidade que mora nas lembranças e até mesmo acho que não está errado dizer que somos o que lembramos. Por isso gosto de contar casos, que é um jeito de fazer amor, dar aos outros pedaços da minha vida que o tempo já matou e enterrou, mas que a maga memória faz ressuscitar. Aquilo que a memória amou fica eterno, disse Adélia Prado, e eu não me canso de repetir. A memória é a presença da eternidade em mim. E é para isso que preciso dos deuses, para que eu nunca esqueça, para que o passado volte sempre...
Recordo as Confissões, de Santo Agostinho. Releio seu maravilhoso capítulo sobre a memória, a meditação mais lúcida e profunda jamais escrita sobre o assunto. Diz ele: Palácio maravilhoso, caverna misteriosa, dentro da memória estão presentes os céus, a terra e o mar... Dentro dela eu me encontro comigo mesmo... É nela que moram os segredos da vida e da morte... E andando pelos seus caminhos, o santo vai à procura do obscuro objeto da nostalgia que faz o seu coração doer, e que beleza alguma é capaz de curar. Ele entra na memória como amante que vai à procura da amada, perdida...
E venho eu e desejo a todos o esquecimento... É que, por vezes, é preciso esquecer para poder lembrar...
Pois a memória, como o próprio santo notou, é o estômago da mente.... Para ali vão as comidas mais variadas, umas saborosas e de digestão fácil, outras amargas e impossíveis de serem digeridas. Quando isso acontece, o corpo se contorce e enjoa, e coisa alguma é capaz de fazê-lo feliz. Até que o próprio corpo se aplica o remédio, vomita, e assim se livra da comida que o fazia sofrer.
Memória, estômago: há nela coisas que precisam ser vomitadas, para que corpo possa de novo se alegrar. Pois o esquecimento é a memória vomitando o que faz o corpo sofrer.
Por isso que Roland Barthes dizia que é preciso esquecer a fim de ficar sábio.
Por isso que Alberto Caeiro dizia que o que ele desejava era desaprender, raspar de sua pele a maneira de sentir que lhe haviam ensinado, para poder, de novo, sentir o gosto bom de si mesmo.
Somos como um navio em que os detritos do mar vão se grudando, em meio ao muito navegar.
De tempos em tempos é preciso que o casco seja raspado, para voltar de novo a deslizar suave pelas águas.
Os detritos da memória depositam-se em nossos olhos, transformam-se numa nuvem leitosa, opaca, catarata, e nos tornamos cegos para o mundo a nossa volta. O mundo inteiro, então, se transforma num monte de detritos.
É preciso esquecer para poder ver com clareza. É preciso esquecer para que os olhos possam ver a beleza.
As Sagradas Escrituras contam a saga da mulher de Ló. Deus permitiu que o casal fugisse das cidades amaldiçoadas de Sodoma e Gomorra sob a condição de que não olhassem para trás, enquanto o fogo do céu as consumia. A mulher não resistiu à curiosidade, olhou para trás, e foi transformada em estátua de sal. Quem fica com os olhos fixados no passado se torna incapaz de ver o presente. E quem não tem olhos para o presente está morto.
Esquecer. Ver com olhos de criança – sem memória.
Mas nem sei por que estou dizendo todas estas coisas para explicar o meu desejo de esquecimento, quando o que eu quero dizer já foi dito por Alberto Caeiro:
O essencial é saber ver/ uma aprendizagem de desaprender/ Saber ver sem estar a pensar/ Saber ver quando se vê/ Ver com o pasmo essencial que tem uma criança, ao nascer/ Sentir-se nascido a cada momento/ para a eterna novidade do mundo...
É isso que desejo para você e para mim, no início de cada ano: esquecimento. Tomar um banho. Deixar a água correr pelo corpo... Sentir os detritos do passado se despregando, e entrando pelo ralo. Recuperar o corpo sem memória da criança, para ver o mundo como se fosse a primeira vez...

Rubem Alves- Teologia do cotidiano- 5/2/93
O passarinho engaiolado

Dentro de uma linda gaiola vivia um passarinho. De sua vida o mínimo que se poderia dizer era que era segura e tranqüila, como seguras e tranqüilas são as vidas das pessoas bem casadas e dos funcionários públicos.
Era monótona, é verdade. Mas a monotonia é o preço que se paga pela segurança. Não há muito o que fazer dentro dos limites de uma gaiola, seja ela feita com arames de ferro ou de deveres. Os sonhos aparecem, mas logo morrem, por não haver espaço para baterem suas asas. Só fica um grande buraco na alma, que cada um enche como pode. Assim, restava ao passarinho ficar pulando de um poleiro para outro, comer, beber, dormir e cantar. O seu canto era o aluguel que pagava ao seu dono pelo gozo da segurança da gaiola.
Bem se lembrava do dia em que, enganado pelo alpiste, entrou no alçapão. Alçapões são assim; têm sempre uma coisa apetitosa dentro. Do alçapão para a gaiola o caminho foi curto, através da Ponte dos Suspiros.
Há aquele famoso poema do Guerra Junqueiro, sobre o melro, o pássaro das risadas de cristal. O velho cura, rancoroso, encontrara seu ninho e prendera os seus filhotes na gaiola. A mãe, desesperada com o destino dos filhos, e incapaz de abrir a portinha de ferro, lhes traz no bico um galho de veneno. Meus filhos, a existência é boa só quando é livre. A liberdade é a lei. Prende-se a asa, mas a alma voa... Ó filhos, voemos pelo azul!... Comei!
É certo que a mãe do passarinho nunca lera o poeta, pois o que ela disse ao seu filho foi: Finalmente minhas orações foram respondidas. Você esta seguro, pelo resto de sua vida. Nada há a temer. Não é preciso se preocupar. Acostuma-se. Cante bonito. Agora posso morrer em paz!
Do seu pequeno espaço ele olhava os outros passarinhos. Os bem-te-vis, atrás dos bichinhos; os sanhaços, entrando mamões adentro; os beija-flores, com seu mágico bater de asas; os urubus, nos seus vôos tranqüilos da fundura do céu; as rolinhas, arrulhando, fazendo amor; as pombas, voando como flechas. Ah! Os prudentes conselhos maternos não o tranqüilizavam. Ele queria ser como os outros pássaros, livres... Ah! Se aquela maldita porta se abrisse.
Pois não é que, para surpresa sua, um dia o seu dono a esqueceu aberta? Ele poderia agora realizar todos os seus sonhos. Estava livre, livre, livre!
Saiu. Voou para o galho mais próximo. Olhou para baixo. Puxa! Como era alto. Sentiu um pouco de tontura. Estava acostumado com o chão da gaiola, bem pertinho. Teve medo de cair. Agachou-se no galho, para ter mais firmeza. Viu uma outra árvore mais distante. Teve vontade de ir até lá. Perguntou-se se suas asas agüentariam. Elas não estavam acostumadas. O melhor seria não abusar, logo no primeiro dia. Agarrou-se mais firmemente ainda. Neste momento um insetinho passou voando bem na frente do seu bico. Chegara a hora. Esticou o pescoço o mais que pôde, mas o insetinho não era bobo. Sumiu mostrando a língua.
Ei, você! – era uma passarinha. – Vamos voar juntos até o quintal do vizinho. Há uma linda pimenteira, carregadinha de pimentas vermelhas. Deliciosas. Apenas é preciso prestar atenção no gato, que anda por lá... Só o nome gato lhe deu um arrepio. Disse para a passarinha que não gostava de pimentas. A passarinha procurou outro companheiro. Ele preferiu ficar com fome. Chegou o fim da tarde e, com ele a tristeza do crepúsculo. A noite se aproximava. Onde iria dormir? Lembrou-se do prego amigo, na parede da cozinha, onde a sua gaiola ficava dependurada. Teve saudades dele. Teria de dormir num galho de árvore, sem proteção. Gatos sobem em árvores? Eles enxergam no escuro? E era preciso não esquecer os gambás. E tinha de pensar nos meninos com seus estilingues, no dia seguinte.
Tremeu de medo. Nunca imaginara que a liberdade fosse tão complicada. Somente podem gozar a liberdade aqueles que têm coragem. Ele não tinha. Teve saudades da gaiola. Voltou. Felizmente a porta ainda estava aberta.
Neste momento chegou o dono. Vendo a porta aberta disse:
– Passarinho bobo. Não viu que a porta estava aberta. Deve estar meio cego. Pois passarinho de verdade não fica em gaiola. Gosta mesmo é de voar...

Rubem Alves - Teologia do cotidiano- 14/2/94